sexta-feira, 18 de julho de 2014

O DESENVOLVIMENTO INFANTIL NA PERSPECTIVA SOCIOINTERACIONISTA: PIAGET, VYGOTSKY e WALLON

           O DESENVOLVIMENTO INFANTIL NA PERSPECTIVA SOCIOINTERACIONISTA:
PIAGET, VYGOTSKY e WALLON

Piaget, Vygotsky e Wallon tentaram mostrar que a capacidade de conhecer e aprender se constrói a partir das trocas estabelecidas entre o sujeito e o meio. As teorias sociointeracionistas concebem, portanto, o desenvolvimento infantil como um processo dinâmico, pois as crianças não são passivas, meras receptoras das informações que estão à sua volta. Através do contato com seu próprio corpo, com as coisas do seu ambiente, bem como através da interação com outras crianças e adultos, as crianças vão desenvolvendo a capacidade afetiva, a sensibilidade e a auto-estima, o raciocínio, o pensamento e a linguagem. A articulação entre os diferentes níveis de desenvolvimento (motor, afetivo e cognitivo) não se dá de forma isolada, mas sim de forma simultânea e integrada.

No entanto, é preciso ter claro que a compreensão de infância, criança e desenvolvimento tem passado por inúmeras transformações, principalmente a partir do final do século passado. O avanço de determinadas áreas do conhecimento como a medicina, a biologia e a psicologia, bem como a vasta produção das ciências sociais nas últimas décadas (sociologia, antropologia, pedagogia, etc.) produziram importantes modificações na forma de pensar e agir em relação à criança pequena.

Devemos considerar que as teorias científicas são produzidas a partir de certas condições de possibilidade (políticas, econômicas, culturais) que vão favorecer sua difusão. Tais teorias também podem sofrer alterações com o passar do tempo. O importante é não entendê-las como verdades definitivas, pois teorias que se pretendem científicas devem ser passíveis de questionamentos, sujeitas, portanto, a transformações.

Henri Wallon (1879-1962), médico francês, desenvolveu vários estudos na área da neurologia, enfatizando a plasticidade do cérebro. Wallon propôs o estudo integrado do desenvolvimento infantil, contemplando os aspectos da afetividade, da motricidade e da inteligência. Para ele, o desenvolvimento da inteligência depende das experiências oferecidas pelo meio e do grau de apropriação que o sujeito faz delas. Neste sentido, os aspectos físicos do espaço, as pessoas próximas, a linguagem, bem como os conhecimentos presentes na cultura contribuem efetivamente para formar o contexto de desenvolvimento.

Wallon assinala que o desenvolvimento se dá de forma descontínua, sendo marcado por rupturas e retrocessos. A cada estágio de desenvolvimento infantil há uma reformulação e não simplesmente uma adição ou reorganização dos estágios anteriores, ocorrendo também um tipo particular de interação entre o sujeito e o ambiente:
·         Estágio impulsivo-emocional (1a ano de vida): nesta fase predominam nas crianças as relações emocionais com o ambiente. Trata-se de uma fase de construção do sujeito, em que a atividade cognitiva se acha indiferenciada da atividade afetiva. Nesta fase vão sendo desenvolvidas as condições sensório-motoras (olhar, pegar, andar) que permitirão, ao longo do segundo ano de vida, intensificar a exploração sistemática do ambiente.
·         Estágio sensório-motor (1 a 3anos, aprox.): ocorre neste período uma intensa exploração do mundo físico, em que predominam as relações cognitivas com o meio. A criança desenvolve a inteligência prática e a capacidade de simbolizar. No final do segundo ano, a fala e a conduta representativa (função simbólica) confirmam uma nova relação com o real, que emancipará a inteligência do quadro perceptivo mais imediato. Ou seja, ao falarmos a palavra "bola", a criança reconhecerá imediatamente do que se trata, sem que precisemos mostrar o objeto a ela. Dizemos então que ela já adquiriu a capacidade de simbolizar, sem a necessidade de visualizar o objeto ou a situação a qual estamos nos referindo.
·         Personalismo (3 a 6anos, aprox.): nesta fase ocorre a construção da consciência de si, através das interações sociais, dirigindo o interesse da criança para as pessoas, predominando assim as relações afetivas. Há uma mistura afetiva e pessoal, que refaz, no plano do pensamento, a indiferenciação inicial entre inteligência e afetividade.
·         Estágio categorial (6anos): a criança dirige seu interesse para o conhecimento e a conquista do mundo exterior, em função do progresso intelectual que conseguiu conquistar até então. Desta forma, ela imprime às suas relações com o meio uma maior visibilidade do aspecto cognitivo.

Lev Semenovich Vygotsky (1896-1934), estudioso russo na área de história, literatura, filosofia e psicologia, teve uma intensa produção teórica, apesar de ter morrido ainda muito jovem. Para este autor, o funcionamento psicológico estrutura-se a partir das relações sociais estabelecidas entre o indivíduo e o mundo exterior. Tais relações ocorrem dentro de um contexto histórico e social, no qual a cultura desempenha um papel fundamental, fornecendo ao indivíduo os sistemas simbólicos de representação da realidade. Isto permite construir uma certa ordem e uma interpretação do mundo real. Desta forma, o desenvolvimento psicológico não pode ser visto como um processo abstrato, descontextualizado ou universal.

Vygotsky afirma que a relação dos indivíduos com o mundo não é direta, mas mediada por sistemas simbólicos, em que a linguagem ocupa um papel central, pois além de possibilitar o intercâmbio entre os indivíduos, é através dela que o sujeito consegue abstrair e generalizar o pensamento. Ou seja, "a linguagem simplifica e generaliza a experiência, ordenando as instâncias do mundo real, agrupando todas as ocorrências de uma mesma classe de objetos, eventos, situações, sob uma mesma categoria conceitual cujo significado é compartilhado pelos usuários dessa linguagem" (Oliveira, 1993, p. 27).

O uso da linguagem como instrumento de pensamento supõe um processo de internalização da linguagem, que ocorre de forma gradual, completando-se em fases mais avançadas da aquisição da linguagem. Para Vygotsky, primeiro a criança utiliza a fala socializada, para se comunicar. Só mais tarde é que ela passará a usá-la como instrumento de pensamento, com a função de adaptação social. Entre o discurso socializado e o discurso interior há a fala egocêntrica, que é utilizada como apoio ao planejamento de sequências a serem seguidas, auxiliando assim na solução de problemas. Esta é a principal divergência entre Piaget e Vygotsky. Em Piaget é exatamente ao contrário, isto é, a fala egocêntrica seria uma transição entre estados mentais individuais não-verbais, de um lado, e o discurso socializado e o pensamento lógico, de outro. Tanto para Piaget quanto para Vygotsky, o discurso egocêntrico é entendido como uma transição, no entanto, entre processos diferentes.

Vygotsky observa que a criança apresenta em seu processo de desenvolvimento um nível que ele chamou de real e outro potencial. O nível de desenvolvimento real refere-se a etapas já alcançadas pela criança, isto é, a coisas que ela já consegue fazer sozinha, sem a ajuda de outras pessoas. Já o nível de desenvolvimento potencial diz respeito à capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de outros. Há atividades que a criança não é capaz de realizar sozinha, mas poderá conseguir caso alguém lhe dê explicações, demonstrando como fazer. Essa possibilidade de alteração no desempenho de uma pessoa pela interferência da outra é fundamental em Vygotsky. Para este autor, a zona de desenvolvimento proximal ou potencial consiste na distância entre o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial. Cabe à escola fazer a criança avançar na sua compreensão do mundo a partir do desenvolvimento já consolidado, tendo como meta etapas posteriores, ainda não alcançadas. O papel do/a professor/a consiste em intervir na zona de desenvolvimento proximal ou potencial dos/as alunos/as, provocando avanços que não ocorreriam espontaneamente.

Vygotsky enfatiza a importância do brinquedo e da brincadeira do faz-de-conta  para o desenvolvimento infantil. Por exemplo, quando a criança coloca várias cadeiras uma atrás da outra dizendo tratar-se de um trem, percebe-se que ela já é capaz de simbolizar, pois as cadeiras enfileiradas representam uma realidade ausente, ajudando a criança a separar objeto de significado. Tal capacidade representa um passo importante para o desenvolvimento do pensamento, pois faz com que a criança se desvincule das situações concretas e imediatas sendo capaz de abstrair.

Para Vygotsky a imitação é uma situação muito utilizada pelas crianças, porém não deve ser entendida como mera cópia de um modelo, mas uma reconstrução individual daquilo que é observado nos outros. Desta forma, é importante salientar que crianças também aprendem com crianças, em situações informais de aprendizado, por exemplo. É comum vermos o quanto as crianças aprendem a montar e desmontar brinquedos, ou mesmo a andar de bicicleta ou de patins, a partir da observação de outros/as colegas.

Jean Piaget (1896-1980), biólogo e epistemólogo suíço, construiu sua teoria ao longo de mais de 50 anos de pesquisa. A preocupação central de Piaget era descobrir como se estruturava o conhecimento. A teoria piagetiana afirma que conhecer significa inserir o objeto do conhecimento em um determinado sistema de relações, partindo de uma ação executada sobre o referido objeto. Tal processo envolve, portanto, a capacidade de organizar, estruturar, entender e posteriormente, com a aquisição da fala, explicar pensamentos e ações. Desta forma, a inteligência vai-se aprimorando na medida em que a criança estabelece contato com o mundo, experimentando-o ativamente. Por exemplo: ao pegar um objeto, o bebê tem oportunidade de explorar e observar de forma atenta, percebendo suas propriedades (tamanho, cor, textura, cheiro, etc) e, aos poucos, vai estabelecendo relações com outros objetos. Tal experiência é fundamental para seu processo de desenvolvimento. Piaget observa que o desenvolvimento pode ser compreendido a partir dos seguintes estágios:
Estágio sensório-motor (0 a 2 anos aprox.): esta etapa é caracterizada por atividades físicas que são dirigidas a objetos e situações externas. Quando a criança adquire a marcha e a linguagem, as atividades externas desenvolvem uma dimensão interna importante, pois toda a sua experiência vai sendo representada mentalmente. A partir da aquisição da linguagem, inicia-se uma socialização efetiva da inteligência. A criança pequena tem extrema dificuldade em se colocar no ponto de vista do outro, fato que a impede de estabelecer relações de reciprocidade.

Estágio pré-operacional (por volta dos 2 aos 6, 7 anos): nesta fase a criança vai construindo a capacidade de efetuar operações lógico-matemáticas (seriação, classificação). Ela aprende, por exemplo, a colocar objetos do menor para o maior, a separá-los por tamanho, cor, forma, etc. Embora a inteligência já seja capaz de empregar símbolos e signos, ainda lhe falta a reversibilidade, ou seja, a capacidade de pensar simultaneamente o estado inicial e o estado final de alguma transformação efetuada sobre os objetos (por exemplo, a ausência de conservação da quantidade quando se passa o líquido de um copo mais largo para um outro recipiente mais estreito). Tal reversibilidade será construída nos períodos operatório concreto e formal. A criança torna-se capaz de desenvolver operações concretas de caráter infra-lógico, tais como as conservações físicas (conservação de quantidade de matéria, de peso, de volume) e a constituição do espaço (conservações de comprimento, superfície, perímetro, horizontais e verticais).
Nos estágios seguintes - operacional concreto (dos 7 aos 11 anos aprox) e operacional abstraio (12 anos em diante) - a criança adquire a capacidade de pensar abstratamente, criando teorias e concepções a respeito do mundo que a cerca.


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